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Sobre presentes e favores06.03.16

Por Heliana Comin Vargas;

Quem adentrou minimamente o campo da antropologia no quesito troca, comércio e consumo, chegará à obra de Marcel Mass, em seu ensaio sobre a dádiva. O que ele nos ensina a partir de povos antigos da Melanésia e Polinésia, entre outros, é que o ato de receber implica na obrigação de retribuir. Ou seja, as motivações para dar, receber e retribuir são de inúmeras ordens envolvendo interesses diversos que acabam por criar um vínculo entre quem dá e quem recebe. É interessante observar que esta relação de obrigatoriedade de retribuir acontece até mesmo no âmbito das religiões onde “diante de um milagre recebido se cumpre uma promessa”. Observem que em nossa língua quando dizemos “obrigado”, por qualquer favor recebido, está implícita a palavra “obrigado a retribuir”. Por isso, que as legislações do setor público consideram como ilegalidade a recepção de presentes pelos servidores públicos. Estes recebem seu pagamento, por meio de impostos pagos pela sociedade para os trabalhos que devem realizar e que devem ser exercidos sem qualquer preferência. Considerando que eles já recebem pelo que fazem, estes presentes podem assumir o caráter de compra de facilidades ou de vantagens extras. Portanto, não é admissível no âmbito do serviço público aceitar presentes e favores extras! Tanto é que, Presidentes e Chefes de Estado não podem receber presentes individualmente, e quando recebem devem incluí-lo ao patrimônio do país. (Resolução nº 3, de 23 de novembro de 2000 “ Regras sobre tratamento de presentes e brindes aplicáveis às autoridades públicas abrangidas pelo Código de Conduta da Alta Administração Federal). Receber presentes (de qualquer natureza, não necessariamente em dinheiro) e favores, ao estabelecer o vínculo entre quem dá e quem recebe, criando a obrigação de retribuir, dá origem ao chamado “rabo preso” no dito popular. Assim, a quantidade de presentes recebidos tende a estar na mesma proporção dos favores prestados, o que no setor público é completamente inadmissível! E para terminar, a origem da palavra gift, conforme mencionado por Mauss, nas línguas germânicas antigas, significa, ao mesmo tempo dádiva e veneno. Ou seja, ao criar a obrigação de retribuir, fica-se obrigado e, de certa forma, escraviza-se o donatário (receptor).