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Revitalização da área central: aprendendo com os shopping centers28.11.15

Texto encaminhado à prefeitura Município de Santo André, para ser publicado em revista local , por ocasião do trabalho de requalificação do centro. 1999

A pesquisa desenvolvida na área central do município de Santo André, tendo como objetivo indicar os caminhos para a sua revitalização, utilizou-se, entre outros, de três instrumentos inovadores do ponto de vista da análise e gestão urbanas: a pesquisa de mercado (city marketing) considerando o centro como um produto; a análise de fluxos de pedestres e seus polos geradores; e, a arquitetura pré-existente.

Entre várias descobertas interessantes, foi possível desmistificar, por exemplo, o significado ou papel dos Shopping Centers como os grandes inimigos da dinâmica das tradicionais áreas de compras retirando deles alguns ensinamentos.

A pesquisa de mercado realizada junto aos usuários do centro, mostrou que uma das grandes deficiências da área central é a falta de atividades de lazer (30%) sendo que, para o município como um todo a falta de praças e áreas verdes aparece na reclamação de 73% dos entrevistados.

Por outro lado, 74% dos usuários que frequentam Shopping Centers, 40% vão em busca de lazer, seguido de alimentação (31%). O que só reforça a condição do lazer , eventos e praça de alimentação como elementos âncoras, atividades estas que parecem não existir nas áreas centrais na proporção necessária.

No entanto, na questão das compras, 78% vêem vantagens de comprar nas lojas do centro, pelo bom preço (67%), ou pela diversidade da oferta (26%).

Aqui já aparece o primeira grande lição dos Shopping Centers, a existência das atividades de recreação e lazer, eventos e serviços especiais funcionando como elementos de atração de consumidores. Na verdade, o que têm acontecido com os centros urbanos é a perda da centralidade, traduzida pela reunião de atividades socio-político-culturais que são a essência para o encontro e a troca e, portanto, para o comércio.

É preciso ressaltar, também, que no início do surgimento dos Shopping Centers regionais nos EUA, eles haviam esquecido que esta centralidade era fundamental, e foi com certeza, na observação do funcionamento das tradicionais áreas de compras que retiraram seus princípios básicos, corrigindo rapidamente este erro. Assim, transformaram-se em centros multi-funcionais reproduzindo , em certa medida, a centralidade urbana espontânea que ocorre nas cidades.

Esta análise vai mais além quando os varejistas locais apontam (48%) os Shopping Centers como o maior concorrente das lojas tradicionais, seguido de perto pelas lojas que vendem produtos semelhantes (em torno de 40%).Significativo também é o fato de que entre os 83% dos lojistas da área central que ainda não têm lojas em Shopping Centers, 68% não tem intenção de tê-las. Isto demonstra uma certa conscientização do baixo grau de liberdade existente entre os pequenos lojistas de Shopping Centers, pressionados por regras e normas rígidas e de custo alto, como por exemplo abertura das lojas além do horário comercial.

Por outro lado, considerar como grande concorrente as lojas que vendem os mesmos produtos demonstra que os lojistas independentes ainda se encontram centrados no produto que vendem e não no mercado que servem. Qualidade de atendimento, venda de mercadorias associadas e oferta de outros serviços foram também apontados como uma deficiência do comércio da área central e muito pouco tem sido feito para mudar este quadro. O perfil dos varejistas, com faixa etária avançada, negócio de tradição familiar, pouco preparo na administração do negócio, observados não apenas em Santo André, mas no Japão, Singapura , França e Inglaterra, só para citar alguns países, é um elemento de forte resistência às mudanças.

Um outro elemento que a pesquisa revelou foi a existência de um excesso de oferta varejista em relação à demanda, em 1999, fortemente reprimida. Com a diminuição do nível de emprego, muitos tornaram-se pequenos patrões. Alíás, até prova em contrário, ser comerciante parece ser um negócio muito simples. Esta situação remete-nos a mais um ensinamento proveniente da administração dos Shopping Centers: controle da oferta e do mix varejista. Qual negócio abrir e onde ?

Logicamente que este controle maior deve referir-se a áreas específicas que representam um forte papel na dinâmica e na imagem da cidade.

A Análise dos fluxos de pedestres nas áreas centrais é outro elemento que ajuda a identificar os polos geradores de fluxos, (instituições públicas, universidades, terminais viários etc), os locais de maior dinamismo bem como os pontos “micados”. Esta análise de fluxos, os Shopping Centers conhecem muito bem. As lojas de departamentos ainda exercem a função de “magnets”, e estrategicamente posicionadas promovem fluxos cruzados que favorecem as lojas menores. Atualmente, outros elementos têm sido usados como polos geradores de fluxo.

O mapa de fluxo de pedestres elaborado para o centro de Santo André, mostra claramente um desequilíbrio acentuado entre a rua Oliveira Lima e as demais. O correto seria balancear este fluxo para reforçar a dinâmica de toda a área, aumentando o seu grau de centralidade. A pesquisa realizada explorou bem esta questão.

Além dos polos geradores de fluxo, o uso residencial, que responde por cerca de 32% do uso do solo na área central, é um elemento de suma importância para a manutenção de fluxos em todo o período.

Finalmente, a análise da estrutura urbana e da arquitetura pre- existente, muitas vezes instigante para a criatividade de um negócio, são elementos que podem contribuir para fazer a diferença. Isto é, criar espaços únicos, labirínticos, que convidam à descoberta e com potencial para concorrer com a padronização dos Shopping Centers, são fortes aliados do processo de revitalização da área central.

Assim, entre as propostas que surgiram desta pesquisa, com a finalidade de revitalização da área central, a organização dos comerciantes acompanhada de perto pelo poder público, pode ajudar na implementação de medidas, semelhantes às usadas pelo seu “pseudo maior concorrente”, os Shopping Centers. Isto os habilitará para melhor se prepararem para as mudanças as quais tendem a ser cada vez maiores e muito mais velozes.

Não podemos esquecer ainda que o e-commerce (comércio eletrônico) está aí, e promete novas revoluções no varejo.

Além destes aspectos brevemente mencionados, o resultado da pesquisa foi altamente revelador em termos da vocação da área central, dos desejos e expectativas da população , da importância de intervir na atividade varejista bem como de outros elementos de intervenção e gestão urbana de caráter sistêmico, que pensamentos conservadores e elitizados, por parte da maioria dos diversos atores envolvidos com o centro, não permitiam desvendar.